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  A CULINÁRIA ITALIANA

Guia italiano de vinhos Gambero Rosso
“1 milhão de leitores conhecem nossas indicações”

Danielle Cernilli


Danielle Cernilli, editor do guia italiano Gambero Rosso, fala ao Portal Veja São Paulo sobre sua publicação, a valorização das uvas autóctones e ainda sobre a evolução e a qualidade dos vinhos italianos.

Por Roberto Gerosa*

Danielle Cernilli é uma testemunha privilegiada da evolução de qualidade do vinho italiano nos últimos anos. Jornalista, sommelier e doutor em filosofia, Cernilli é editor do Gambero Rosso - tradicional guia publicado há dezenove anos na Itália. Na World Wine Experience em São Paulo e no Rio de Janeiro, em abril deste ano, ele coordenou as degustações “I Tre Bicchieri do Guia Gambero Rosso”, uma seleção de rótulos de várias regiões da Itália que obtiveram a premiação máxima da publicação, e os “Grand Cru do Piemonte”, um painel de grandes barolos e barbarescos da região.

Não por acaso, vinhos que Cernilli costuma beber nas suas horas de lazer, segundo relatou ao Portal Veja São Paulo, em uma entrevista, concedida por e-mail, antes de embarcar para o Brasil. É uma rara oportunidade de ouvir a opinião de um especialista que há trinta anos se ocupa de provar a avaliar tintos, brancos e espumantes e orientar os consumidores para os melhores rótulos lançados na Itália.

Como é produzido o guia Gambero Rosso?
O Gambero Rosso é publicado há 19 anos. Nós vendemos cerca de 85.000 cópias (em co-edição com o slow food), na Itália, e também em outras duas edições, em língua inglesa e alemã. O que significa, presumivelmente, que ao menos 1 milhão de leitores conheçam a nossa valoração. O painel de degustação é formado por degustadores de diversas proveniências (são 100 no total). Primeiro é realizado um painel local de uma região analisada. Depois, representantes deste painel se reúnem e fazem a eleição final do vinho.

Como o guia vem lidando com o tema “tipicidade”? Ser típico é um dos critérios de qualidade adotados na avaliação?
Nós valorizamos de maneira positiva a expressão territorial do vinho, que é
um dos aspectos fundamentais para definir o conceito de qualidade.

O número de vinhos premiados com o I Tre Bichieri (premiação máximo do Guia Gambero Rosso) aumentou ao longo dos últimos anos?
Sim, o número de I Tre Bichieri foi aumentando, nos últimos anos, em virtude do crescimento do nível de qualidade das vinícolas e dos vinhos. (Em 2006, porém, houve uma queda de 7% no volume de rótulos premiados com a cotação máxima, que foi creditado pelo guia a problemas climáticos na safra de 2002).


Os vinhos produzidos com uvas autóctones (variedades nativas de uma região) do sul da Itália, como aglianico, nero d’ávola e outros, voltam a ser valorizados e premiados. O Taurasi Cinque Terre 2001, de Salvatore Molletieri, por exemplo, produzido com aglianico, foi eleito o melhor tinto do Gambero Rosso em 2006. A que se deve isso?
O Taurasi foi premiado como melhor vinho da Itália este ano, mas nos anos anteriores foi premiado como um vinho proveniente de outra região, não necessariamente do Sul. O aglianico é seguramente uma parcela de vinha interessante, mas igual a muitas outras de regiões espalhadas pela Itália, como barbera, nebbiolo, corvina, teroldego, lagrain, refosco, sangiovese, montepulciano, cesanese, negroamaro, primitivo e magliocco. Na minha opinião, estas parcelas são a espinha dorsal do comportamento vitivinícola italiano.

Esta valorização das uvas autócnes é uma tendência no mercado exportador. Como se dá o consumo de vinhos destas variedades no mercado interno?
O fenômeno de vinhos provenientes de “vitgni autoctoni” é sempre um fator predominante para o consumo interno na Itália. Somente há poucos anos estes vinhos se tornaram interessantes para alguns mercados externos.

Explique um pouco o critério das denominações italianas, e como elas podem ajudar o consumidor na hora da comprar sua garrafa na prateleira.
Os DOCS na Itália são exatamente como os AOCs franceses. São feitos para disciplinar as produções, definem áreas vitivinícolas, sistemas de cultivo das vinhas, tipo de vinhas permitidas e técnicas de vinificações. São, portanto, frutos das legislações que regulamentam as produções e que neste sentido dão garantias ao consumidor final. Baseiam-se, na Itália e França, mais na sua proveniência territorial (dos diferentes vinhedos) do que na sua diferença varietal  -- ao contrário do que acontece nos países do Novo Mundo. Nestes países se privilegia a variedade da uva, mas o resultado fatalmente é um produto “standarizado” e globalizado, e também mais simples para a interpretação do consumidor. Pode ser mais fácil para orientá-lo, mas nem sempre simplicidade é sinônimo de qualidade.

Quais são, hoje, os vinhos que melhor representam a Itália? E os produtores que são referência da evolução italiana dos últimos anos?
Temos pelo menos mil rótulos que representam bem a Itália hoje, seguramente todos aqueles que temos premiado com o I Tre Bichieri nas últimas edições. Entre os produtores e vinícolas que representam o ponto referencial para a evolução do vinho italiano poderia destacar Gaja, Antinori, Feudi di San Gregório, Tasca D’Almerita.... Estes foram os primeiros que me vieram à mente, e, na minha opinião, foram decisivos para a evolução da qualidade dos vinhos produzidos na Itália nos últimos anos.

Quais são os vinhos mais adequados para um iniciante brasileiro começar a conhecer e experimentar os vinhos italianos?
O Brasil é o país quente com clima muito variado, mas definitivamente em grande parte tropical e equatorial. Se eu começasse a beber vinho italiano no Rio de Janeiro, provavelmente me dedicaria à degustação de brancos de vinhas tradicionais não fermentados em barricas, ou seja, vinhos fáceis de beber. Se eu estivesse em São Paulo ou Porto Alegre, me dedicaria à degustação de vinhos tintos de médio corpo, guardados em barricas grandes e provenientes de vinhas tradicionais.

Recentemente em uma degustação às cegas realizada em São Paulo, comparando grandes tintos de Bordeuax, Chile e Itália, os rótulos italianos – representados por dois exemplares do que se convencionou chamar de supertoscanos – levaram a pior. Ficaram em último lugar na avaliação de críticos e público. O que acha deste resultado? É possível que os chamados supertoscanos tenham sido supervalorizados ou a comparação entre estes rótulos e regiões não faz sentido?
Comparar vinhos de Bordeaux com os supertoscanos de safras diversas é uma operação incorreta. O Sassicaia, por exemplo, é um vinho magnífico, mas não é um Bordeaux. Se você o degusta tendo em mente as características e os parâmetros qualitativos dos melhores vinhos de Bordeaux, você fatalmente o penalizaria.

O vinho italiano vem perdendo espaço no mercado brasileiro. Já foi o europeu mais importado e hoje perde dos vinhos do Chile, Argentina, Portugal e França. Qual a razão o senhor atribui esta queda? Esta é uma tendência que se observa no resto do mundo?
Nos Estados Unidos acontece exatamente o contrário. Os mercados são evidentemente distintos, mas acho que é absolutamente normal que os vinhos da América do Sul encontrem maior espaço no Brasil comparados aos europeus. Também creio ser muito racional, e previsível, que os vinhos de Portugal - país que o Brasil tem uma relação histórica e cultural muito forte - obtenham sucesso em vosso mercado.

Já provou algum rótulo brasileiro?
Nunca bebi vinhos brasileiros, espero poder experimentá-los durante minha viagem.

Quando está em casa, na hora do lazer, qual sua bebida predileta?
Tenho muito pouco tempo livre, mas quando estou com os amigos bebo vinhos, principalmente tintos. Meu preferidos são barolos e barbarescos (do Piemonte), Chianti clássico e Brunello di Montalcino (da zona central da Toscana). Entre os brancos italianos que aprecio, destaco os provenientes do Alto Adige (Sylvaner e Veltliner della Valle d´Ísarco). Adoro ainda os champanhes dos Recoltant Manipulant.
(Matéria publicada na edição de 24.04.2006)

*Colaborou Alexandra Corvo

(© Revista Veja São Paulo)

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