A matéria publicada na edição 2016 Revista Veja, intitulada “Não per
tutti - Atenção, descendentes de imigrantes: a Itália estuda limitar a
concessão de sua cidadania”, de autoria do jornalista Victor De Martino,
gerou apreensão em muitos descendentes de italianos, que reúnem
documentos para obter a cidadania italiana. O texto trata, com destaque,
sobre a proposta de restrição da cidadania italiana à primeira e à
segunda geração, apresentada no âmbito das mudanças na Lei n. 91, de
05/02/1992, que atualmente rege os direitos da cidadania na Itália –
emendas que deverão ser votadas entre os meses de setembro e outubro no
Parlamento italiano.
Segundo a matéria publicada por Veja, a Itália deve restringir a
concessão da cidadania ainda em 2007, atendendo pressão da União
Européia. A razão da cobrança do bloco europeu seria o fato do país
possuir uma legislação “muito flexível”, o que estaria causando
“vantagens para seus descendentes”, em detrimento daqueles dos países
vizinhos. Diferente da França e da Espanha, na Itália a cidadania “é
estendida a todos os descendentes de italianos por parte de pai. Tanto
faz se são filhos, netos ou têm parentesco mais distante” – comenta a
matéria.
Ao concluir, o texto de Veja faz referência aos 760.000 processos de
cidadania em análise na Itália, sendo que desses 500.000 são de
brasileiros – o que estaria causando a sobrecarga de trabalho nos
consulados e cartórios.
Pontos que não foram abordados na matéria e que mereceriam ser
mencionados no texto:
- A história dos emigrantes italianos, da forma como eles foram
praticamente banidos de seu país de origem – em vista da fome e da
miséria a que estavam submetidos.
- A precária situação dos consulados italianos no Brasil, em termos
de estrutura funcional. Inclusive uma petição on-line, iniciativa dos
COMITES – Comitê dos Italianos no Exterior - e do CGIE – Conselho Geral
dos Italianos no Exterior -, reúne assinaturas que deverão ser enviadas
ao governo italiano, pedindo providências a este respeito.
- O fato de todo o cidadão italiano, por lei, ter o direito a morar e
trabalhar em qualquer Estado membro da Comunidade Européia, e que esta
prática não se restringe ao comportamento de ítalo-descendentes. A busca
por melhores oportunidades em países como Inglaterra, Espanha, Suíça e
Estados Unidos ser uma prerrogativa dos cidadãos italianos sem
distinção.
- A Itália, dificultando o direito à cidadania, abre mão de uma
grande massa de trabalhadores com um bom grau de especialização –
superior, inclusive, a tantos outros que para lá imigram - necessária
não apenas ao próprio país – cada vez mais envelhecido, de acordo com as
estatísticas – , mas também à indústria européia.
- E por último: dado o fato da Itália ainda ser considerada um país
sério – diferente de tantos outros, situados mundo afora – é de se
esperar que qualquer alteração em lei, tendo esta amplitude e
profundidade, vá apresentar um período que assegure a cidadania àqueles
que manifestarem o interesse, além daqueles que já ingressaram com o
pedido e estão na fila de espera.
(©
Oriundi)
Restrições ao direito da cidadania II: Senador
eleito pelos italianos residentes no Exterior tem proposta contrária aos
seus eleitores
Antes de comentar o assunto principal, que são as restrições à
Cidadania Italiana, como propõem algumas correntes políticas, é
necessário entender como um Senador eleito pelos italianos residentes no
Exterior, possa ter serenamente um programa político contrário aos
eleitores que o elegeram.
É bem simples entender, sabendo-se que, no sistema eleitoral
italiano, não existe o Voto Direto. Vota-se nas Listas Partidárias,
elaboradas pelos Capopartiti, que dominam a cena política italiana.
Ou seja, alguns poucos políticos profissionais de longo percurso, que
têm em mãos os seus “currais” eleitorais, elaboram a Lista do Partido
que será votada nas eleições. Com exceção de duas ou três Províncias,
que possuem Estatuto próprio, onde vota-se na Lista e também diretamente
no parlamentar preferido. Portanto, no geral, vota-se somente na vontade
de poucos chefões partidários. Nada democrático! Vejam o exemplo, quando
um Senador demonstra claramente que não tem compromissos com seus
eleitores.
Pior ainda, quando este Senador também demonstra não ter conhecimento
jurídico para saber que direitos adquiridos são inalienáveis em todos os
Países civilizados !
A Cidadania Italiana funda-se sobre o Direito de Sangue, pelo qual o
filho de pai ou mãe italianos, independente se o nascimento ocorra no
Exterior, é Cidadão Italiano.
Este principío, em tempos modernos, vem sendo aplicado desde os
primórdios do Estado Italiano atual, citado explicitamente no Estatuto
Albertino, firmado por Carlos Alberto de Savoia, aos 4 de março de
1848, retomado pelo primeiro Codico Civil Italiano de 1865, reeditado
pela Lei n. 555, de 13 de junho de 1912, e confirmado pela atual Lei n.
91, de 5 de fevereiro de 1992, sobre a qual, atualmente, debate-se
mudanças no Parlamento.
Pelo principio jurídico fundado pelos textos legais citados, o
cidadão nasce italiano! Não que lhe seja concedida a Cidadania
Italiana, no momento do reconhecimento. Esta é a diferença fundamental,
ignorada pelo Senador Pollastri.
Assim, é juridicamente impossível, legislar na base do: … a cidadania
cessa de ser transmitida aos nascidos no Exterior, a partir da terceira
geração. (Per Fidel sarebbe possibile, Senatore!)
Como citei no artigo anterior, até poderia ser criado um Dever de
Opção, quando na maioridade, o cidadão italiano, de pais e avós também
nascidos no Exterior, deveria optar por manter ou não a Cidadania
Italiana, dando-lhe um prazo razoavelmente possível de fazê-lo. E
aqueles que já tivessem cumprido a idade de opção, teriam, como de fato
tem, os seus direitos intocáveis. Mesmo assim, creio que se alguém se
esquecesse de fazer a tal Opção, ou que, alegando justo motivo, prove
que não teve condições de fazê-la em tempo hábil, recorrendo, ainda
teria ganho de causa!
O que deve ser reprovado no momento é a maneira terrorista que estão
sendo divulgadas as notícias pela corrente dos “contras” da cidadania.
Anteriormente, o Vice-Ministro Degli Affari Esteri, Sen. Franco
Danielli, e o ex-Consul de Curitiba e atual ocupante da Direzione
Generale per gli Italiani all’estero e le Politiche Migratorie, Mario
Trampetti, divulgaram notícias na Revista Insieme, afirmando que a
cassação da Cidadania a partir da terceira geração, dependia apenas de
“uma canetada”.
Agora o Senador Pollastri, fiel defensor da idéia, divulga através da
Revista Veja, um semanário de mais de um milhão de cópias, que a idéia
será colocada em prática imediatamente.
Todos, sem nenhuma explicação, de como, tecnicamente, isto poderia
ser feito.
Se a intenção é espantar os interessados dos Consulado Italianos no
Brasil, certamente, o efeito será justamente o contrário !
Retornando ao pensamento político do Senador Pollastri, foi dele a
frase “Così arriveremo a Adamo e Eva!”, quando soube da proposta do
Deputado Merlo, que concede a Cidadania também para os filhos de mães
italianas, nascidos antes de 1.1.1948. (Anterior, a esta data, pelas
disposições do ordenamento jurídico do antigo Reino da Itália, a
cidadania era transmitida somente pelos homens.).
Em linhas gerais, o Senador acha que não deve ser atribuída a
Cidadania, porque não fica bem, pessoas que não tenham uma ligação
cultural estreita com a Itália, possam ostentar o titulo de Cidadão
Italiano.
Esquece o Senador, que o Estado Italiano gasta um mucchio di soldi do
Orçamento, para que este legame culturale seja restabelecido e mantido!
Os Institutos Culturais, as Associações, os Comites recebem dinheiro
para manter estas ligações culturais, e recriá-las, onde o tempo a
corroeu. Não se pode pretender eliminar a doença, matando o paciente!
A população da península itálica, por 16 séculos, ficou dividida em
pequenos reinos, ducados e comunes, vitima dos interesses de príncipes,
invasores, e toda ordem de opressão, que impediam a formação de uma
verdadeira Nação italiana.
Somente a partir do final da primeira metade do Século 19, que
começou a ser forjada a Pátria Italiana, e que tornou-se realidade aos
17.03.1861, data da L’Unità D’Italia.
Nossos bisnonnos vieram para a “Mérica” anos após a Unificação,
oprimidos pela crise econômica e pela miséria nos campos, desiludidos
diante da fome de impostos do novo Estado, que gerou o maior numero de
desapropriação de imóveis da história.
Não que a maioria dos emigrantes fosse formada por grandes
proprietários de terra. Pelo contrário, a imensa maioria era de
contadini giornalieri (Bóia-fria) e bovai (Cuidadores de gado) que não
possuíam nenhum bem. Moravam amontoados nas casas cedidas pelos
proprietários, e estes, bem ou mal, permaneceram na Itália.
Mesmo diante de nenhum motivo para recordar da miséria que deixaram
do outro lado do Atlântico, a italianidade permaneceu forte, até os dias
de hoje. Primeira, segunda, … quantas gerações fossem, sempre temos
orgulho em dizer que somos italianos!
É um erro pensar que limitando o direito à cidadania, estaria fazendo
um bem à pureza da Nação italiana!
Novamente, afirmo que a Itália perde uma grande oportunidade de
repovoar seu território com sangue italiano, além de perder também boa
mão-de-obra necessária às industrias, criando obstáculos ao rientro dos
Oriundi.
O Senador Pollastri deveria propor programas de inserção social e
econômica dos italianos nascidos no Exterior, interessados em vir para a
Europa, procurando ganhar a concorrência com outros Países da Comunidade
Européia.
É uma mentira deslavada dizer que outros Países da CE estariam
pressionando a Itália para tomar iniciativas no senso de limitar a
aceitação de processos de reconhecimento da cidadania.
Necessitaria apenas, fazer frente à realidade em curso, com medidas
criativas e competentes, no sentido de aproveitar esta grande
oportunidade, quando a Europa precisa de trabalhadores, e alguns países
latino-americanos poderiam dispensar parte do contingente pronto para o
trabalho.
Senador Pollastri, saiba que amanhã, queira ou não, o sol nascerá
novamente! Não adianta lutar contra isso! Colha a oportunidade para ser
um defensor da causa que o elegeu, e não o contrário.
Por Imir Mulato -
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Oriundi)
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